Episódio 2 – Como se divertir acompanhando o Xadrez Moderno
Há quase dois anos eu escrevi o que seria, na minha imaginação, o primeiro de uma série de artigos sobre o Xadrez. Estava empolgado com a série “O Gambito da Rainha” e impressionado com a maneira como o Xadrez cresceu durante o período da Pandemia.
Eu havia concebido uma série de sete artigos onde eu contaria a história do Xadrez e tocaria em vários temas relativos ao assunto, os campeões mundiais, o uso do Xadrez (e do esporte, de maneira geral) como propaganda política, a evolução da Inteligência Artificial, etc.
Eu gostei muito do primeiro artigo e, quando comecei a escrever o segundo, percebi que não seria capaz de prosseguir com o que tinha planejado. Eu não conheço Xadrez suficiente para falar com propriedade sobre os campeões mundiais e quais foram as suas contribuições de uma forma pessoal. Me vi meramente copiando textos de outras fontes e achei que isso não era legal.
Então, o projeto ficou parado.
Nesse meio tempo, tornei-me um fã de Xadrez. Eu digo fã e não jogador porque eu não jogo, eu apenas estudo, faço exercícios de tática e acompanho a cena brasileira e internacional, da mesma forma que se acompanha qualquer esporte profissional. Aprendi o suficiente para acompanhar qualquer partida e reconhecer o valor dos bons jogadores.
E esse é o mote deste artigo que vai encerrar essa série: como se divertir com o Xadrez sem necessariamente ser um enxadrista? Que mensagem podemos tirar disso para o nosso hobbie de jogos modernos?
Jogar Xadrez bem é algo que cobra do jogador uma vida inteira de dedicação. Mesmo nos níveis mais baixos, a competitividade é imensa e, sem estudo, você vai apenas colecionar derrotas. Eu não acho que vencer seja a coisa mais importante para um jogador social (como acredito ser a maioria dos que me lêem), mas jogar sabendo que não se tem chance nenhuma quase o tempo todo é muito sem graça.
Porém, o Xadrez pode ser muito interessante se abordado apenas como um esporte que você assiste. Ver as partidas dos grandes mestres com o auxílio da análise de outros enxadristas ou mesmo assisti-los jogando online enquanto comentam seu próprio jogo pode não lhe ensinar a jogar (como você não aprende a jogar bola vendo o Barcelona na tevê), mas pode ser uma ótima forma de entretenimento.
Antigamente, era quase impossível (e muito chato) acompanhar partidas de xadrez. Você basicamente tinha que pegar a anotação da partida em um jornal ou livro e tentar acompanhar pelos diagramas (ou montar o tabuleiro e repetir as jogadas). Hoje, com a explosão do jogo na internet, há uma infinita quantidade de streamers analisando as partidas dos torneios principais, sem em tempo real ou após a partida, com nível de profundidade ao gosto do freguês.
O que vou fazer nesse artigo é apresentar:
- As modalidades em voga no Xadrez Moderno
- Qual a estrutura dos principais torneios
- Quais são os principais jogadores da atualidade (com uma certa discussão sobre as tretas que rolam nos bastidores e na internet)
- Quais são os principais canais pelos quais consumo Xadrez, e o que eu acho mais legal (ou não tão legal assim) em cada um deles;
Tempo, tempo, tempo…
Quando falamos em modalidades do Xadrez, estamos basicamente falando do controle de tempo que será utilizado para as partidas. Existem “variantes” de Xadrez que de vez em quando são utilizadas em torneios de alto nível, como “Chess360”, onde as peças não ficam nos seus lugares comuns, mas são sorteadas, seguindo algumas regras. Existe também um tabuleiro para jogar com 4 pessoas e outras bizarrices, mas não falaremos sobre isso.
Existem inúmeras regras para controle do tempo, que podemos concentrar em 3 categorias:
- Xadrez Clássico ou “Pensado”: é a principal categoria, sendo o formato que se usa nos principais torneios, como o torneio de candidatos e o mundial. Normalmente o jogador começa com algo como uma hora e meia de tempo e ganha 30 segundos a cada lance e normalmente ganha-se um tempo a mais se a partida chegar no 40o. lance. Nesse formato o jogador possui tempo para pensar profundamente sobre as jogadas e analisar as suas variantes.
- Xadrez Rápido: é uma categoria intermediária, onde os jogadores costumam ter 30 ou 15 minutos para jogar seus lances (podendo haver algum tipo de incremento por lance). É muito utilizada nos níveis de competição mais baixos ou em torneios de tiro curto, onde os jogadores jogam diversas partidas no mesmo dia.
- Blitz: são jogos onde o jogador tem normalmente de 5 a 3 minutos para jogar seus lances (podendo haver incremento de alguns segundos por lance). É um modo muito popular no jogo online e serve também como uma espécie de diversão para os jogadores mais experientes. Existe uma sub-modalidade dentro desse mesmo espírito chamada de Bullet, onde o jogador tem um minuto para jogar seus lances.
O controle de tempo define em muito a forma como uma partida será jogada. Partidas pensadas serão normalmente jogadas de forma mais posicional, buscando um final onde se tenha alguma vantagem material ou melhor estrutura de peões (no Xadrez, “final” é uma das fases do jogo, normalmente quando restam poucas peças no tabuleiro).
Em jogos mais rápidos, é mais fácil conseguir encontrar um golpe tático, que lhe deixa em vantagem para arrematar a partida ou simplesmente tira a iniciativa do adversário e lhe permite ganhar por tempo.
Embora todos os enxadristas considerem a forma pensada como a principal, as modalidades rápidas e de blitz vem ganhando muito espaço, por permitirem transmissões mais interessantes.
Ver como essa situação vai se desenvolver é uma das grandes questões do Xadrez atual.
A Hierarquia dos Torneios de Xadrez
Existe uma miríade de torneios internacionais de Xadrez, indo daqueles que decidem os grandes campeões até aqueles que são abertos onde os jogadores em início de carreira podem fazer jogos oficiais para melhorar seu rating e, quem sabe, conseguir as titulações.
A FIDE (Federação Internacional de Xadrez, a “FIFA” do Xadrez) organiza diversos torneios de classe A, sendo a Copa do Mundo, a Olimpíadas e o Mundial de Xadrez os principais.
A Copa do Mundo é um torneio eliminatório individual e a Olimpíada é um torneio por equipes. Já o Mundial de Xadrez é uma relíquia que vem dos tempos românticos do Xadrez, uma mistura de “Copa Toyota” com o Karatê Kid 2.
Calma, eu explico: Copa Toyota porque o campeonato na verdade é apenas um match (de várias partidas) entre dois jogadores: o atual campeão e o desafiante (e daí vem a comparação com o Karatê Kid 2: o campeão já está na final).
Enquanto o Campeão espera, os candidatos a desafiante se enfrentam em um torneio duríssimo chamado, mui propriamente, “Torneio de Candidatos”. A coisa é tensa, 8 jogadores absurdamente fortes, jogando turno e returno. Quem tiver mais pontos, leva. Se empatar, há um match de desempate.
Os candidatos são escolhidos por diversos métodos. Para o presente ano (2022), oito candidatos foram escolhidos da seguinte forma:
- O vice-campeão mundial (no caso, o campeão do torneio de candidatos do ano anterior), o russo, Ian Nepomniachtchi.
- Os dois finalistas da Copa Mundial de Xadrez, foram o polones Jan-Krzysztof Duda e o russo Sergey Karjakin. Este foi desqualificado por ter publicado opiniões polêmicas sobre a guerra entre Rússia e Ucrânia e será substituído por Teimur Radjabov, do Azerbaijão (indicado pela FIDE, devido ao fato de ter sido impossibilitado de jogar o torneio de candidatos anterior por causa do COVID).
- Os dois finalistas do FIDE Grand Swiss Tournament de 2021, o iraniano naturalizado francês Alireza Firouzja e o italiano naturalizado norte-americano Fabiano Caruana.
- Os dois finalistas do Grand Prix, uma série de torneios fechados que foi realizada nos primeiros meses deste ano, o Americano Hikaru Nakamura e o húngaro Richard Rapport.
- O jogador com o maior rating da atualidade (tirando o próprio campeão, que é o noruegues Magnus Carlsen), o chines Ding Liren.
Para quem quiser acompanhar, o Torneio de Candidatos acontecerá de 16 de junho a 5 de julho de 2022. Além de olhar o site oficial, é provável que todos os streamers que citarei neste artigo estarão produzindo análises sobre as partidas deste torneio.
Com certeza haverão transmissões ao vivo também mas, pessoalmente, eu não recomendo muito. Xadrez pensado demora demais!
Ratings e Titulações
O rating nada mais é do uma quantidade de pontos que é dada ou retirada dos jogadores em todas as partidas oficiais que jogam. A quantidade de pontos ganha ou perdida depende da diferença de nível entre os jogadores. Se você ganhar de alguém bem melhor que você, você ganha muitos pontos, se você ganha de alguém mais fraco, não ganha quase nada.
Para facilitar, é basicamente o mesmo sistema que o BGA (Board Game Arena) usa para classificar seus jogadores.
As titulações são um reconhecimento ao alto nível alcançado por um jogador. Existem muitos títulos, que vão de Mestre Nacional (outorgado pelas federações nacionais) até Grande Mestre (outorgado pela FIDE), bem como titulações exclusivas para mulheres (o que não as impede de ganhar as titulações absolutas, Judit Polgar é uma Grande Mestre e não uma Grande Mestre Feminina, por exemplo).
Para ganhar uma titulação existem basicamente dois requisitos: um valor mínimo de rating e uma certa quantidade de “normas”.
Norma é uma pontuação que é estimada durante um torneio de acordo com a força dos adversários. Você pode ter o rating de 2000, mas se entrar em um campeonato cheio de gente mais forte que você e conseguir ir bem, você terá desempenhado como alguém de rating maior, digamos, de 2300. Esse valor é a sua norma naquele torneio e, se passar acima dos valores pré-estabelecidos pela FIDE, servirá para atender o requisito dos títulos.
Os títulos são como as faixas do judô, uma vez obtidos, são vitalícios. Ninguém deixa de ser grande mestre, mesmo que o nível de performance caia depois de alguns anos.
O “melhor de todos os tempos versus o “midiático”
Escolhi dois dos principais jogadores que estarão envolvidos com o mundial deste ano para ilustrar o momento que vivemos.
O primeiro é o atual campeão do mundo, Magnus Carlsen, tido como um dos maiores jogadores de todos os tempos, talvez maior até mesmo que os lendários (e ainda vivos) Gary Kasparov e Bob Fisher.
Ele foi um menino-prodígio e confirmou seu potencial quando amadureceu. Campeão do mundo pela primeira vez em 2013, vem mantendo o título desde então. Seu estilo é principalmente posicional, que busca pequenas vantagens ao longo da partida para conseguir um final vantajoso.
Carlsen é dono de uma das principais plataformas de Xadrez Online do Mercado, a Chess24 e frequentemente faz séries de partidas online para divulgar o esporte e sua plataforma (da qual falaremos um pouco mais adiante).
Hoje acredita-se que ninguém é páreo para vencê-lo em um match. Em dois mundiais a série terminou empatada com vitória do Carlsen no desempate em partidas rápidas, mas no último ano, contra o Nepo, Carlsen passou o rolo compressor, tanto em termos psicológicos como enxadrísticos. O match terminou faltando 3 partidas a jogar.
É difícil encontrar alguma fraqueza no jogo do Carsen, mas o seu grande destaque é capacidade de levar a melhor em finais complicados. Aliando isso ao seu forte jogo posicional (que na maior parte das vezes lhe coloca em um final favorável) ele é quase imbatível em partidas pensadas.
O segundo jogador que vamos destacar é o mago das partidas rápidas, o nipo-americano Hikaru Nakamura, outro menino-prodígio que confirmou seu potencial na maturidade.
Naka (como é conhecido) é um forte jogador em qualquer ritmo de tempo (tanto que se classificou para o torneio de candidatos deste ano, o que foi algo surpreendente) mas seu forte são as partidas de blitz, onde é praticamente imbatível (a menos quando joga com o Carlsen, com quem faz matches duríssimos, mas costuma perder no final).
Seu estilo é bem mais tático e, segundo ele mesmo, a sua melhor característica é capacidade de se defender em posições difíceis.
Nakamura é um streamer, ele joga diariamente em seu canal comentando as partidas e às vezes entra em polêmicas por falar mal de seus adversários.
Naka não é o favorito para vencer o Torneio de Candidatos (acredito que seja o chines Ding Liren), mas eu o escolhi porque ele é o mais midiático, ele joga diariamente online, transmitindo para o mundo suas partidas e fazendo comentários. De certa forma, é o “super GM” mais próximo do público e, embora não sendo necessariamente simpático (como veremos a frente), é fácil torcer por ele, pois temos uma sensação maior de proximidade.
Deu Brasil?
O segundo motivo porque escolhi o Naka para destacar foi porque ele e Carlsen foram derrotados recentemente pelo melhor brasileiro da atualidade, o GM Luis Paulo Supi.
Jogando uma série de partidas de blitz numa campanha do seu site que o campeão foi carimbado por Supi, jovem GM brasileiro que lhe aplicou uma derrota numa belíssima partida de 16 lances. O vídeo abaixo mostra o Carlsen jogando a partida e a sua reação quando o enxadrista brasileiro faz o lance decisivo, um lindo sacrifício de dama que garante a vitória.
O campeão pediu a revanche, na qual o Brasileiro ficou melhor, mas acabou sendo enrolado pelo campeão que conseguiu vencer a partida no tempo. Ao final desta, Carlsen comentou “perigoso esse aí, espero não ter que encontrá-lo de novo”.
Com o Nakamura, a situação foi mais desagradavel: ambos (Supi e Nakamura) costumavam jogar bastante entre si online, normalmente com grande vantagem para o americano. Eis que , um belo dia o Supi ganhou 4 partidas seguidas. Nakamura, que não é conhecido por ser um bom perdedor, começou a insinuar que o brasileiro estava “acertando demais” (isso é, que ele poderia estar usando uma engine – um computador para analisar os lances).
Na internet é comum terem jogadores de rating ruim que usam engine para inflar seus resultados. Mas é improvável que jogadores de renome, que jogam partidas internacionais e tem uma carreira a zelar façam isso. As insinuações feitas pelo Nakamura, ainda mais contra um parceiro regular, foram muito feias.
O Supi quando soube ficou muito chateado e fez esse vídeo aqui revendo as partidas e explicando a situação.
Aqui cabe um comentário sobre o significado dessas vitórias, pois o leitor pode imaginar que o Supi talvez possa estar próximo de chegar à elite do Xadrez mundial já que ele venceu dois dos maiores jogadores da atualidade.
Podemos ver isso por dois lados: por um lado, sendo um GM, o Supi já pertence a essa elite. Como se pode ver na ilustração acima, pouco mais de 1600 jogadores possuem o título de GM. A partida contra o Carlsen poderia ocorrer mesmo que o Supi fosse um jogador bem mais fraco, mas com certeza ele não teria o Naka como adversário regular se não fosse um jogador respeitado.
Por outro lado, assim como existe uma diferença abissal entre um professor de judô que seja faixa-preta e o Teddy Riner (lendário judoca francês, campeão de 5 olímpiadas), o mesmo acontece no Xadrez. No alto nível, 100 pontos de rating é uma diferença gigantesca. Supi está por volta de 2500 na FIDE enquanto os “Super GMs” possuem mais de 2700.
Não é para desmerecer, é uma façanha vencer esses caras em qualquer tipo de partida, mas não é que seja um aborto da natureza. Todas essas partidas foram amistosas e em ritmo de Blitz, não se comparam ao que aconteceria num match de partidas pensadas, como o que acontece no campeonato mundial.
Supi pode vir a ser um grande jogador, talento ele tem, mas é muito difícil para um brasileiro ficar fora muito tempo jogando os torneios fortes da Europa onde se pode pegar experiência e ganhar rating. Faltam recursos e patrocínio.
O Xadrez online é uma vitrine, mas ele pouco ajuda no treinamento do Xadrez clássico (talvez até atrapalhe).
Principais Plataformas e Sites de Stream brasileiros
Para terminar, vou citar alguns dos principais sites onde consumo Xadrez online.
A comunidade de Xadrez é muito maior, pelo menos dez vezes maior, do que a comunidade de board games. A quantidade de sites é imensa. O meu objetivo aqui é citar alguns que eu assisto ou utilizo. Isso não quer dizer que sejam os melhores, são apenas os que eu gosto e consumo.
Vou citar duas plataformas, dois streamers amadores e dois dois enxadristas titulados que também são streamers. As plataformas são lugares para jogar, treinar e analisar partidas. Os streamers “amadores” são jogadores razoavelmente fortes que não são titulados, mas que tratam seus canais de forma bastante profissional e os dois enxadristas são um jogador que já foi o melhor do Brasil por muito tempo e hoje se dedica a treinar jogadores mais jovens e o outro é um jogador ativo que foi campeão Brasileiro em 2019.
São duas das principais plataformas, com uma infinidade de recursos. Eu assino a Chess.com. Gosto muito de fazer os problemas de tática e assistir às lições com desafios. Não costumo jogar, mas ela dá diversas opções de jogar contra engines (configuradas como se fossem pessoas normais ou jogadores conhecidos, têm até a Beth Harmon), outros jogadores e inúmeros torneios online.
O diferencial da Chess24 é o seu dono, o Magnus Carlsen. Ele traz todos os caras tops para fazer vídeos e dar aulas no seu site. Eu o utilizei muito pouco, mas achei que seria interessante apresentá-lo como alternativa.
Canais de Enxadristas amadores, mas Streamers Profissionais: Raffael Chess e Xadrez Brasil
Raffael Chess era focado em fazer lives jogando partidas de blitz e vídeos editados mostrando partidas famosas ou séries onde ele jogava limitado a usar aberturas esquisitas (como a famosa Grob 1. g4) e ver até que rating conseguia ir. Com a pandemia, começou a ter um retorno maior e investiu mais tempo no canal, se arriscando a transmitir torneios de Xadrez ao vivo, o que foi um grande sucesso, chegando a ter picos de 12 mil pessoas acompanhando uma partida entre o Carlsen e o Nakamura.
Raffael é um excelente jogador amador e isso fica claro nas partidas que joga no site e no respeito que lhe é atribuído pelos enxadristas profissionais que dão moral e jogam contra ele de vez em quando (o Roberto Molina cogitou uma vez que o Raffael joga o suficiente para obter o nível de mestre naciona).
Seu sucesso como streamer lhe permitiu não só largar o emprego de técnico industrial para se dedicar totalmente ao canal, como também de jogar partidas amistosas contra super GMs (já jogou até com o Carlsen). Recentemente ele venceu o Ding Liren, número 2 do mundo, durante uma simultânea (onde o Liren jogou várias partidas ao mesmo tempo). Ele transmitiu a partida ao vivo e foi muito interessante ver suas reações quando viu que tinha chances e quando finalmente venceu a partida.
Já no canal Xadrez Brasil, Rafael Leite, seu dono, foca em fazer vídeos editados de análises de partidas clássicas ou das partidas importantes que estiverem ocorrendo na semana. Sua análise é aparentemente um pouco menos profunda que a do seu xará gaúcho, mas ele compensa com uma melhor didática. Ele se fia muito mais em vídeos editados do que em lives e tem um tom muito mais sóbrio do que o Raffael Chess (que muitas vezes até incomoda com um certo exagero na tentativa de aumentar a carga dramática das narrações).
Ambos são muito bons no que fazem e merecem o sucesso que alcançaram.
Canais de Enxadristas profissionais: GM Rafael Leitão e MI Roberto Molina
A principal diferença dos canais dos profissionais e dos amadores é a capacidade de análise. Isso pode ser bom ou ruim, dependendo da sua compreensão de Xadrez. Os dois que cito aqui são os que mais se preocupam com o entretenimento entre os jogadores que produzem conteúdo na Internet.
O Rafael Leitão já foi o melhor jogador Brasileiro mas hoje se dedica mais a sua academia de xadrez, e a geração de conteúdo (não sei se ele tem outros negócios, além de fazer merchandising de uma camisa em seus vídeos).
Em seu canal é praticamente 100% destinado a análises de partidas. Ele gosta muito de apresentar partidas suas para explicar determinados temas de sua predileção, ou então de comentar partidas recentes que tenham chamado sua atenção. Seu tom é informal, bastante irônico até, mas as análises são boas e os vídeos tem um tom bem humorado.
Sendo do Maranhão e torcedor fanático do Sampaio Correia, faz frequentes provocações ao rival Moto Clube (tendo inclusive um personagem criado por ele, o Motildo, que sempre aparece como responsável por uma jogada primitiva que leva a mate do adversário).
Outros personagens que frequentemente aparecem em suas transmissões são a Dona Barrilda (uma referência a uma barrinha colocado ao lado do tabuleiro pelas plataformas de xadrez quando se faz a análise de uma partida), o Peixe de Emergência (quando ele consulta o Stockfish durante uma análise para verificar algo que não tinha visto antes) ou o Peixe Supremo (quando cita uma análise feita pelo Stockfish no topo de sua configuração).
Já o Molina, é uma figura. O carro chefe do seu canal é com o jogador jogando partidas online. Seus comentários sobre seus adversários ou sobre si mesmo são hilários, principalmente quando começa a perder. Ele cria bordões como “invadir o milharal”, “posição licso“, chama o adversário de “capivara” (gíria do xadrez para jogador fraco) canta musiquinhas e discute com seu cachorro, o rajado, enquanto joga torneios online como o Tilted Tuesday, da Chess.com.
Molina ainda não é um GM, ele está no degrau anterior, o de Mestre Internacional. A principal dificuldade, como sempre, é disputar torneios oficiais presenciais que lhe dêem oportunidade de conquistar os pontos e as normas (acho que falta uma). No final do ano passado ele viajou para Espanha onde jogou diversos torneios, com resultados intermediários e ele sempre gravava um resumo das partidas no final. Nesse momento, vimos um Molina mais real, menos zoeiro.
Para quem busca o entretenimento, é o melhor jogador para se assistir. Suas lives normalmente ocorrem na Twitch, porém versões editadas de suas partidas vão para o Youtube.
Conclusão
Acompanhar um esporte é, na maioria das vezes, um gosto que precisa ser adquirido. Isso vale até para o futebol (a maioria das pessoas só vê a copa do mundo ou uma grande final caso seu time esteja envolvido), quanto mais para o Xadrez.
Os tabuleiristas, de maneira geral, tem uma relação estranha com o Xadrez. O rei dos jogos é um jogo ciumento: para decifrá-lo ele cobra total dedicação do enxadrista, enquanto nós, jogadores de jogos modernos, somo como Don Giovanni na ópera de Mozart: fazemos listas quilométricas de quantos jogos jogamos e a grande maioria não passa da primeira partida.
Se o Xadrez me ensina algo, é que talvez aproveitemos muito pouco das dezenas (centenas?) de jogos que jogamos.
Meu objetivo aqui não é incentivar ninguém a largar o nosso hobbie e virar enxadrista, mas ser capaz de admirá-lo, ainda que a distância, pois isso pode ser uma grande fonte de lazer.
As referências que coloquei aqui são apenas um início. O Xadrez é um universo à parte, inesgotável. Que esse guia sirva como um pequeno mapa, mas cuidado, se você entrar demais pelo buraco do coelho, cuidado, ele pode nunca mais ter fim!
Eduardo Vieira é analista de sistemas, e participa do Hobby desde 2018, mas vem tentando descontar o tempo perdido! É casado, mora no Rio de Janeiro e vive reclamando que não tem parceiros para jogar tudo que compra!
Rapaz, que delícia de texto !!!! Parabéns !!!
Joguei xadrez na adolescência, mas nunca avancei muito…kkkk jogo bem esporadicamente.
Realmente é uma vida pra aprender a jogar direito. Gostei muito de saber que posso começar a acompanhar mais o xadrez sem me preocupar em realmente joga-lo. Você abriu algumas portas e oportunidades de hobby. Obrigado.
Espero que vc repense e escreva mais sobre xadrez, mesmo que textos mais curtos.
Seu texto pode ser comparado ao livro O Jogo Imortal de David Shenk, lá ele descreve porque a maioria de nós não vai avançar tanto no xadrez como gostaríamos. E tudo bem….kkkk
Parabéns Covil, já gostava das lives, agora virei fã dos posts….continuem assim, trazendo gente legal, que sabe escrever.
Abraço.
Fausto,
Obrigado pelos comentários. Não conhecia esse livro que você citou, vou procurá-lo.
Sds,
Eduardo